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Direito Ambiental - Assessoria Jurídica

Ouro Azul

A água que se pode entender como apropriada ao consumo humano pode ser encontrada em quantidades comparativamente reduzidas em todo o mundo. Vale dizer, apenas 0,003% (três milésimos por cento) do volume total de água existente. Não obstante tal consideração de caráter técnico, à exceção de alguns, poucos povos deram a devida importância a tão precioso insumo.

Para se ter uma idéia da falta de atenção para com a água, até 1988 ainda existiam no Brasil as denominadas águas particulares, conforme o que dispunha o artigo 8º do Código de Águas (Decreto nº 24.643 /34): “São particulares as nascentes e todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, quando as mesmas não estiverem classificadas entre as águas comuns de todos, as águas públicas ou as águas comuns.”

Apenas com a promulgação da Constituição Federal, em 05 de outubro de 1988, foi que a leitura do Código de Águas (Decreto nº 24.654 /34) já não mais pode ser feita considerando a existência de águas de domínio privado.

Muito embora a Constituição Federal tenha disposto como sendo a União (CF /88, artigo 20, inciso III) e os Estados (CF /88, artigo 26, inciso I) os únicos entes a deterem o domínio sobre as águas existentes no território brasileiro, somente em 1997, com o advento da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei nº 9.433 /97), ou seja, aproximadamente 11 (onze) anos após a promulgação da Constituição Federal, é que se pode ter a devida efetividade de tais dispositivos constitucionais.

Dentro desse contexto, o inciso I, do artigo 1º, da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, ao estabelecer seus princípios, o fez de imediato expressando que “a água é um bem de domínio público”. E, como colocado anteriormente, em sendo feita uma leitura conforme à Constituição Federal, a água constitui-se em um bem de domínio público tão somente da União, dos Estados e do Distrito Federal.

Para que não restem dúvidas, ao final da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, em seu artigo 57, tem-se que foram revogadas todas as disposições em contrário. Assim, afastou-se por completo o que o Código de Águas dispunha em relação à existência legal de águas particulares (Decreto nº 24.654 /34, artigo 8º).

Além do estabelecimento de as águas serem um bem de domínio público, a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos também expressou que a água se constitui em um recurso natural limitado e dotado de valor econômico (Lei nº 9.433 /97, artigo 1º, inciso II). A água passou a ser tida legalmente no país não apenas como um bem, mas, principalmente, um recurso.

Assim sendo, foi-lhe atribuída, legalmente, a devida condição ao respectivo valor pecuniário.

Ainda que possa ter sido legalmente atribuído a consideração de que a água se trate de um recurso, mais precisamente, recurso hídrico, não é facultado aos entes da Federação que detém seu domínio (União, Estados e Distrito Federal) a possibilidade de comercializá-la.

No Brasil, de acordo com o artigo 18 da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei nº 9.433 /97), os recursos hídricos não podem ser alienados mesmo por quem detém seu domínio, uma vez que a outorga de recursos hídricos não significa sua alienação. Significa, isto sim, apenas e tão somente, a autorização administrativa dos órgãos competentes para a concessão do direito de seu uso àqueles que se encontrem em condições de requerê-la e expressem o interesse através do respectivo requerimento aos órgãos competentes.

Em clara e inequívoca demonstração de que a denominada outorga de recursos hídricos constitui-se apenas e tão somente em direito de uso das águas outorgadas, tem-se que em determinadas situações, tal direito, ou seja, a outorga, poderá ser suspenso parcial ou totalmente, por tempo determinado ou em definitivo (Lei nº 9.433 /97, artigo 15).

A Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei nº 9.433 /97) constitui-se, assim, e com clareza, em uma política pública destinada ao devido e necessário gerenciamento dos recursos hídricos no país. Em sendo uma política pública para o país, tanto a União, os 26 (vinte e seis) Estados que integram a Federação, assim como o Distrito Federal, encontram-se subordinados por força de Lei a esta política.

Todos os Estados brasileiros devem, portanto, adequar suas respectivas Leis estaduais relativas ao gerenciamento dos recursos hídricos estaduais à Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos. Caso os Poderes Executivos e Legislativos dos Estados não o façam, o Poder Judiciário poderá ser provocado para exigir que assim procedam.

Pela leitura da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei nº 9.433 /97) pode-se observar que em muitos de seus 57 (cinqüenta e sete) artigos existem fortes correlações com a nova ordem legal mundial adotada a partir de 1997 na Convenção da ONU denominada de “Convenção sobre os Direitos dos usos dos Cursos de Água Internacionais Não Destinados à Navegação”. Em especial no que se relaciona a 3 (três) importantes Princípios relacionados na citada Convenção Internacional: i) Equidade; ii) Razoabilidade; e iii) Não Causação de Danos.

De uma forma ou de outra, quer através da leitura da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos ou quer pela leitura da Convenção da ONU para os Cursos D’água para Fins Diferentes da Navegação, o grande objetivo reside na possibilidade de se ter água em quantidade e qualidade tanto para as presentes quanto para as futuras gerações no Brasil e em todos os demais países.

Wlamir do Amaral - Advogado - Professor de Direito