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Direito Ambiental - Assessoria Jurídica

Receituário agronômico e responsabilidade administrativa, civil e penal

Qualquer pessoa física ou jurídica que utilize agrotóxicos1, em regra2, deverá obter previamente o respectivo Receituário Agronômico. Não importa se a pessoa for utilizar “agrotóxicos e afins” com vistas à comercialização da produção agrícola, como insumo ou mesmo para consumo próprio.

O Receituário Agronômico constitui-se em um documento que se destina à comercialização de agrotóxicos, devendo, ao teor do Artigo 13, da Lei nº 7.802/89 (Lei de Agrotóxicos) ser elaborado por um técnico especializado: “A venda de agrotóxicos e afins aos usuários será feita através de receituário próprio, prescrito por profissionais legalmente habilitados ...” (grifo nosso).

É possível ser entendido, portanto, e de uma maneira geral, que o Receituário Agronômico trata-se de um documento que pode ser comparado ao receituário médico prescrito para a compra de medicamentos. Em regra, a fiscalização da comercialização de agrotóxicos é efetuada pelos Estados e Distrito Federal (Lei nº 7.802 /89, Artigo 10).

A despeito da exigência legal da prescrição do Receituário Agronômico, de acordo com o que vem sendo noticiado muitas são os pessoas físicas e jurídicas que não vêm cumprindo este dever legal.

Existem casos em que grandes compras de agrotóxicos, efetuadas, inclusive, diretamente da empresa que os produz, não há o cumprimento do dever legal da prévia apresentação do Receituário Agronômico. Vale dizer que tanto o comprador, ou seja, o grande produtor não apresenta o Receituário Agronômico no ato de sua compra, assim como o vendedor, ou seja, a empresa que o produz, também não o exige.

Ainda que se possa argumentar acerca do desconhecimento dessa exigência legal, há que se considerar o que expressa o Artigo 3º, da Lei de Introdução ao Código Civil3 (“Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”) e o fato de que se constituem em grandes empresas que, em regra, têm um corpo jurídico destinado a dar suporte legal às respectivas atividades.

Em outro extremo, muitas têm sido as situações em que pequenos agricultores também adquirem agrotóxicos sem a apresentação do Receituário Agronômico e sem que o comerciante o exija. Muito embora não seja a grande empresa considerada no parágrafo anterior, uma vez que todos são iguais perante a Lei (CF /88, Artigo 5º, caput) e as normas ambientais são de cumprimento obrigatório por todos, há que se responsabilizar aqueles que não a cumprirem; quer sejam grandes ou pequenos.

Para qualquer que seja a situação, quando da não existência do Receituário Agronômico, com a devida salvaguarda da exceção legal expressa na parte final do Artigo 13, da Lei de Agrotóxicos, todos4 serão solidariamente responsáveis. Vale entender, todos poderão responder administrativa, civil e criminalmente pela violação do disposto no Artigo 13, da Lei de Agrotóxicos e Afins.

A responsabilidade administrativa pela infração ao disposto na Lei nº 7.802/89, aí inclusa a não existência do Receituário Agronômico (Artigo 13), sujeitará a todos os envolvidos, solidariamente, às sanções administrativas expressas nos nove incisos do artigo 17 da Lei referida (advertência; multa; etc.).

A responsabilidade civil em virtude da não existência do Receituário Agronômico, apenas ocorrerá com a provocação do Poder Judiciário; quer pela pessoa física ou jurídica afetada pelo cometimento de alguma violação à Lei ou quer pelo Ministério Público. Não existindo o Receituário Agronômico já se consuma a violação da Lei (Lei nº 7.802 /89, Artigo 13), impondo-se a responsabilidade do infrator às obrigações de fazer e/ou de não fazer e a responsabilidade de indenizar pelos danos materiais e morais causados (Código Civil, Artigo 927).

A responsabilidade penal da pessoa física pelo “descumprimento” das “exigências estabelecidas”, dentre as quais se insere a obrigatoriedade da existência do Receituário Agronômico (Lei nº 7.802 /89, Artigo 13) pode ser encontrada no Artigo 15 da Lei de Agrotóxicos (reclusão de dois a quatro anos e multa).

Já a responsabilidade penal da pessoa jurídica5 pelo não atendimento às exigências legais, vale entender, in casu, a não existência do Receituário Agronômico, encontra-se expressa no artigo 56 da Lei de Crimes Ambientais6 7 (Lei nº 9.605 /98). A esse propósito há que salientar que seu Artigo 4º possibilita até mesmo a desconsideração da pessoa jurídica “sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente”.

Finalmente, há ainda que se considerar a responsabilidade sócio-ambiental das empresas. Muito embora nesse tipo de responsabilidade não haja sanção legal alguma, há o inequívoco prejuízo à imagem da empresa, com a conseqüente perda de mercado.

Wlamir do Amaral - Advogado - Professor de Direito

1 A definição legal de “Agrotóxicos e Afins” encontra-se no inciso I do artigo 2º da Lei de Agrotóxicos (Lei nº 7.802 /89).

2 Diz-se “em regra” uma vez que nas situações expressas pelo artigo 67 do Decreto nº 4.074 /02 poderá haver a comercialização de “agrotóxicos e afins” sem a necessidade da apresentação do respectivo Receituário Agronômico (Lei nº 7.802 /89, art. 13, parte final): “Art. 67. Os órgãos responsáveis pelos setores de agricultura, saúde e meio ambiente poderão dispensar, com base no art. 13 da Lei 7.802, de 1989, a exigência do receituário para produtos agrotóxicos e afins considerados de baixa periculosidade, conforme critérios a serem estabelecidos em regulamento. Parágrafo único. A dispensa da receita constará do rótulo e da bula do produto, podendo neles ser acrescida eventuais recomendações julgadas necessárias pelos órgãos competentes mencionados no caput.” (grifo nosso).

3 Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de Setembro de 1942.

4 Lei nº 7.802 /89, art. 14: “As responsabilidades administrativa, civil e penal pelos danos causados à saúde das pessoas e ao meio ambiente, quando a produção, comercialização, utilização, transporte e destinação de embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, não cumprirem o disposto na legislação pertinente, cabem: a) ao profissional ...; b) ao usuário ...; c) ao comerciante ...; d) ao registrante ...; e) ao produtor ...; f) ao empregador ....”. (grifo nosso).

5 Podendo haver a co-autoria e a participação da pessoa física (Lei nº 9.605 98, arts. 2º e 3º).

6 Lei nº 9.605 /98, art. 56: “Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos. Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa”.

7 Em tempo, de acordo com a Lei de Crimes Ambientais, as penas a serem impostas á pessoa jurídica encontram-se expressamente relacionadas nos arts. 21 a 24 da Lei nº 9.605 /98.